a intimidade é o a
mor






estetoscópio




Quando se olha para dentro de uma pessoa não há alma, não há coração, apenas músculo para onde o sangue escorre e é expulso e para onde teima em voltar. Há gordura, fáscias, peritonio, estômago com tumores ou úlceras malignas. Há fios que outro cirurgião deixou para corrigir aquela ardência chata. Bridas a obstruir o antigo caminho. Desejos, projetos, minha eterna obsessão. Nada disso se vê quando se olha para dentro da gente. Apenas vasos que sangram e orgãos imperfeitos. Sê se demora muito o corpo reclama, os monitores apitam e é preciso parar, voltar outro dia. Talvez as drogas adormeçam a alma e os sonhos.

Talvez o corpo faça apitar as máquinas quando ficamos perto demais de descobrir-lhe os últimos segredos.

pelos dentes


Elas não se seguram nas palavras
os olhares chegam atrasados
as idéias são estúpidas
e a alma é segredo.
Elas não se encontram no café
recolhem o pudor no chão
o vestem com imperfeição
e guardam os brinquedos.
Elas não se prendem na dor
não se agarram nos segredos
não se envolvem no domingo.
Elas se algemam na pele
da cor do inferno.
Elas se engaiolam nos lençois
num corpo subalterno.
Elas se prendem pelos seios
bicos dos seios
pois lá
há menos sensibilidade.


quentes e macios


"beije-me as coxas
pálpebras, dedos, lóbulos
os dois
beije-me os seios
um e outro, que são ciumentos
ambos
beije-me os lábios
superior e inferior
os grandes e pequenos
todos".

Marta Medeiros





medo que dá medo do medo que dá - Lenine

durante o dia de hoje contei quantas vezes senti medo.

senti medo ao acordar atrasada e visualizar a cara feia que poderia encontrar no trabalho.
senti medo ao caminhar na rua em direção ao metrô.

senti medo anterior ao gesto de colocar a mochila na frente do corpo a fim de protegê-la.
senti medo de ficar sedentária ao preferir a escada rolante à escada normal
.
senti medo ao atravessar o corredor de onibus
.
senti medo do barulho que o elevador faz para subir.
senti medo de não conseguir.
senti medo de ser enganada.
senti medo da pressa em se voltar para casa depois do trabalho
.
senti medo dos olhares dos bêbados do boteco
.
senti medo do tempo que deixa as pessoas mais feias.
senti medo de ficar com dor de garganta.

12 vezes.
o caso é grave, doutor?

Ele me receitou um antibiótico que não tomei, pois tive medo que agredisse meu estômago.
Aí me apareceu ele, Gandhi, e me salvou com uma cura rápida. Disse-me guiado por sua sabedoria:
"O medo tem alguma utilidade, mas a covardia não."
E me olhou sabendo que tinha se feito entender. Que notícia boa! - grito ao
s céus. Com meus 12 medos não há problema, que fiquem todos aí. Agora tenho que fazer outra contagem muito mais importante: quantos passos para trás dei - sendo que poderiam ter sido para frente - devido ao meu medo?

E você?

Já adianto: para isso o Gandhi não pode te ajudar.





dia mundial da água


Só sei que algo veio à tona e prendi forte o choro na garganta. Fiquei com vergonha besta e resolvi prender.
Durante aqu
ela noite fui ao banheiro 4 vezes seguidas. Não havia mais nada para sair, mas a vontade era enorme. Parecia que havia 2 litros dentro de mim. Era a água que não saiu pelos olhos, que ficou presa, procurando um escape. Era o que estava dentro que precisava sair. E o nosso corpo é perfeito, sábio, faz de tudo para se equilibrar. Por isso todas as nossas emoções resultam no corpo. O corpo a todo momento tenta se "virar", lidar com o que passamos para ele...

a água no corpo representa nossas emoções (não só a água do choro)...


é a segunda vez que passo por isso... que desidrato não só pelos olhos.







Nossa Costura

Vem a linha para unir duas partes diferentes.
Essa linha que nos junta, nos iguala, nos diferencia.
Essa linha que agrega, adiciona, enfeita.
Uma vem com palavras
outra vem com imagem.
Uma vem com medos
outra vem com coragem.
É a costura que se forma lentamente e precisa
graciosa essa costura que nos junta e suavisa.